terça-feira, 14 de agosto de 2012

Obras de Jorge Amado relacionado ao Cangaço

Extensa é a bibliografia sobre o cangaço, de estudos sociológicos à reportagem documental. Na literatura, destacam-se o romance O Cabeleira (1876) de Franklin Távora, e as obras de José Lins do Rego, Jorge Amado, Raquel de Queiroz e Guimarães Rosa, este último autor de Grande sertão, veredas, considerado o maior romance já escrito sobre os cangaceiros. No cinema, sobressaíram O cangaceiro (1953) de Lima Barreto e Deus e o diabo na terra do sol (1964) de Gláuber Rocha. Mas iremos destacar as obras de Jorge Amado, em homenagem aos seu centenário.


                        Seara Vermelha, de Jorge Amado
Terminado de escrever em junho de 1946, Seara vermelha, de Jorge Amado, é o segundo romance mais divulgado no estrangeiro, compreendendo 26 idiomas: albanês, alemão, árabe, armênio, búlgaro, chinês, eslovaco, espanhol, finlandês, francês, grego, hebráico, húngaro, italiano, japonês, lituano, moldávio, polonês, romeno, russo, sérvio, sueco, tcheco, turco, ucraniano e vietinamita. Além da edição portuguesa que recebeu prefácio do escritor Álvaro Salema.

A obra está enquadrada na ótica explicitamente ideológica do escritor. Faz parte de sua fase de militância política. Depois de tecer sobre a sorte do migrante nordestino que se arrasta rumo à morte querendo chegar em São Paulo, ele mostra como nasce a violência no campo e, inclusive, o fanatismo religioso. Os cangaceiros e os novos messias surgem a partir das injustiças sociais e o desprezo do estado.


Há uma importante mudança de cenário: a narrativa não se passa na Cidade da Bahia e seu Recôncavo, nem à vista dos cacauais do eixo Ilhéus-Itabuna. Jorge Amado abandona a zona do cacau, e localiza o relato no sertão baiano.

É a saga de uma família de retirantes compulsórios, gente expulsa de terras nordestinas, que toma o rumo de São Paulo. A pé. A viagem é um rol de aflições, de fome e de morte. Do grupo inicial de onze retirantes, apenas quatro chegam a uma fazenda de café. Além disso, Jorge Amado descreve as trajetórias de três filhos do casal de retirantes, que tinham partido de casa antes dos pais: o soldado João, o jagunço Zé Trovoada e o cabo Juvêncio, que serve na fronteira com a Colômbia, participa do levante comunista de Natal (novembro de 1935), vai parar no presídio de Ilha Grande e, depois da anistia, retoma os passos de sua vida militante.

Seara Vermelha
reflete a injustiça e o desamparo dos pobres explorados pelos senhores feudais do Nordeste brasileiro. A lúcida perspectiva da personagem feminina, exemplo de esperança, contrapõe-se ao mundo masculino, questionando as decisões que afastam os homens das suas raízes. Os seus três filhos representam a tríplice resposta que pode ser dada à crueldade dos poderosos: José vinga-se pela via do cangaço, João procura as respostas messiânicas e Juvêncio, o grande herói deste romance, reage aderindo às lutas sociais.

Temática


O romance estampa a realidade brasileira com destaque para injustiça e o desamparo sofridos pelo povo na terra que não é sua. "A Seara vermelha de sangue e de fome onde crescem brotos de dor e de revolta".


Enredo


O novo proprietário de antiga fazenda nos sertões do Nordeste baiano despede sumariamente todos os agregados ali existentes, admitidos pelo antecessor, inclusive o velho Jerônimo e sua mulher Jucundina, moradores radicados nas terras havia vinte anos. Sem outra opção, decide emigrar "em busca do país de São Paulo" e, entrouxando todos seus pertences nos costados do jumento Jeremias, partem, a pé, os onze parentes: Jerônimo e a mulher, os dois filhos restantes (Agostinho e Marta), os três netos (Tonho, Noca e Ernesto) órfãos ainda crianças, sua irmã insana Zefa e seu irmão João Pedro com a família (Dina e Gertrudes), numa longa "Viagem de espantos", eles que jamais se haviam afastado do lugar.


Padeceram perigos, doenças, luto, sede e fome até atingirem Juazeiro, para embarcarem de navio em demanda a Pirapora pelo rio São Francisco. Ali chegam em péssimas condições, alquebrados. Aí, ao enfim acomodarem-se numa fazenda de café, restam da família apenas quatro: Jerônimo, Jucundina, João Pedro e o garoto Tonho - os outros morreram ou desencaminharam.


Na segunda parte do romance, "As estradas da esperança)", o eixo narrativo se desloca para os três filhos homens de Jerônimo e Jucundina: José, João e Juvêncio. E se ocupa dos destinos dos três filhos do casal que haviam deixado a casa, na fazenda nordestina, antes da dolorosa retirada.


João, o primogênito, em família apelidado João, deixara o campo para assentar praça na Força Policial do Estado, sendo posteriormente engajado à tropa mandada ao sertão para liquidar o acampamento do beato Estêvão, ao qual acorreu também, mas para defendê-lo, o célebre bandido Lucas Arvoredo, em cujo bando atuava o famigerado Zé Trevoada, que outro não era senão José, o segundo filho do casal, que ainda jovem abandonara o lar paterno e se fizera cangaceiro. Ao se dar o assalto da força pública contra o acampamento dos fanáticos penitentes, em meio á confusão de gritos, como animais em fúria, e o troar da fuzilaria, corpos varados a bala, João foi mortalmente atingido e logo em sua percepção os ruídos se tornaram baixinhos, uma nuvem em seus olhos: a última coisa que viu "perfeitamente vista era a face de seu irmão José disparando o fuzil".

O terceiro filho, Juvêncio, deixou os pais ainda adolescente à busca do mundo distante, tendo-se alistado na Polícia Militar de um Estado vizinho e de pronto incorporado ao batalhão de partida para sufocar a Revolução Constitucionalista em São Paulo, onde, depois de tudo apaziguado, ingressa no Exército, indo servir em Matos Grosso. De Campo Grande, já promovido a cabo, vai para um posto de fronteira com a Colômbia em que, em condições desesperadoras, assume o comando do sitiado posto, semidizimado, sistematiza caçadas para o abastecimento, cava novas trampas, recompõe paliçadas e mantém a resistência aos silvícolas até chegar a expedição de socorro. Transferido para Natal, conhece Lurdes e participa do levante comunista como um dos seus líderes.


Preso após a sedição é condenado a cumprir pena no presídio da Ilha Grande, onde se casa por procuração com Lurdes e cuida de ilustrar-se. Aí recebe a visita da velha mãe viúva, vinda de São Paulo em companhia do jovem Tonho, com quem futuramente, após a anistia, participará ativamente da militância comunista no Brasil.


Texto parcial de
O Estado de São Paulo

Capitães da Areia, de Jorge Amado

Análise da obra

A obra Capitães da Areia foi escrita na primeira fase da carreira de Jorge Amado, e nota-se grandes preocupações sociais. As autoridades e o clero são sempre retratados como opressores (Padre José Pedro é uma exceção mas nem tanto; antes de ser um bom padre foi um operário), cruéis e responsáveis pelos males. Os Capitães da Areia são tachados como heróis no estilo Robin Hood. No geral, as preocupações sociais dominam, mas os problemas existenciais dos garotos os transforma em personagens únicos e corajosos, corajosos Capitães da Areia de Salvador.

A grande admiração de Jorge Amado pelos vagabundos ensejou o romance Capitães da Areia. A narrativa se desenrola no Trapiche (hoje Solar do Unhão e o Museu de Arte Moderna); no Terreiro de Jesus (na época era lugar de destaque comercial de Salvador); onde os meninos circulavam na esperança de conseguirem dinheiro e comida devido ao trânsito de pessoas que trabalhavam lá e passavam por lá; no Corredor da Vitória área nobre de Salvador, local visado pelo pelo grupo porque lá habitavam as pessoas da alta sociedade baiana, como o comendador mencionado no início da narrativa.


Foco Narrativo

O livro é dividido em três partes. Antes delas, no entanto, via uma seqüência de pseudo-reportagens, explica-se que os Capitães da Areia é um grupo de menores abandonados e marginalizados, que aterrorizam Salvador. Os únicos que se relacionam com eles são Padre José Pedro e uma mãe-de-santo. O Reformatório é um antro de crueldades, e a polícia os caçam como os adultos antes do tempo que são.

Personagens

Pedro Bala: Era um jovem loiro de 15 anos, que tinha um corte no rosto. Era o chefe dos Capitães da Areia, ágil, esperto, respeitador e sabia respeitar a todos. Saiu do grupo para comandar e organizar os Índios Maloqueiros em Aracaju, desejando com líder do grupo Barandão. Depois disso ficou muito conhecido por organizar várias greves, como perigoso inimigo da ordem estabelecida.

Professor: Era um garoto magro, inteligente, calmo e o único que sabia ler no grupo. O professor era quem planejava os roubos dos Capitães da Areia. Depois de muito tempo aceitou um convite e foi pintar no Rio de Janeiro.

Gato: Era o mais bonito e mais elegante da turma.Candidato a malandro do bando, tinha em caso com Dalva mulher das noites, que lhe dava dinheiro, por isso, muitas vezes, não dormia no trapiche. Só aparecia ao amanhecer, quando saía com os outros, para as aventuras do dia.Participava dos planos mais arriscados e era muito malandro e esperto. Tempos depois foi embora para Ilheús tentar a sorte.

Volta-Seca: Imitador de pássaros e afilhado de Lampião, era mulato sertanejo de alpargatas.

Sem Pernas: Era um garoto pequeno para sua idade, coxo de uma perna, agressivo, individualista. Era quem penetrava nas casas de família fingindo ser um pobre órgão com o objetivo de descobrir os lugares da casa, onde ficavam os objetos de valor depois fugia e os Capitães da Areia assaltavam a casa. Seu destino foi suicidar-se atirando-se do parapeito do elevador Lacerda, pelo ódio que nutria pela polícia baiana.

João Grande: Negro, mais alto e mais forte do bando. Cabelo crespo e baixo, músculos rígidos. Após a morte de seu pai, João Grande não voltou mais ao morro onde morava, pois estava atraído pela cidade da Bahia. Cidade essa que era negra, religiosa, quase tão misteriosa como o verde mar. Com nove anos entrou no Capitães da Areia. Época em que o Caboclo ainda era o chefe. Cedo, se fez um dos chefes do grupo e nunca deixou de ser convidado para as reuniões que os maiorais faziam para organizar os furtos. Ele não era chamado para as reuniões porque ele era inteligente e sabia planejar os furtos, mas porque ele era temido, devido a sua força muscular. Se fosse para pensar, até lhe doía a cabeça e os olhos ardiam. Os olhos ardiam também quando viam alguém machucando menores. Então seus músculos ficavam duros e ele estava disposto a qualquer briga. Ele era uma pessoa boa e forte, por isso, quando chegavam pequeninos cheios de receio para o grupo, ele era escolhido o protetor deles. O chefe dos Capitães da Areia era amigo de João Grande não por sua força, mas porque Pedro o achava muito bom, até melhor que eles. João Grande aprendeu capoeira com o Querido-de-Deus junto com Pedro Bala e Gato. João Grande tinha um grande pé, fumava e bebia cachaça. Não sabia ler. Era chamado de Grande pelo professor, admirava o professor. O professor achava João Grande um negro macho de verdade.

Pirulito: Era magro e muito alto, um cara seca, meio amarelado, olhos fundos, boca rasgada e pouco risonha. Era o único do grupo que tinha vocação religiosa apesar de pertencer ao Capitães da Areia. Quando parou de roubar, para sobreviver vendia jornais, seu destino foi ajudar o padre José Pedro numa paróquia distante.

Boa Vida: Era mulato troncudo e feio, o mais malandro do grupo. Muito preguiçoso, era o único que não participava das atividades de roubo do grupo. Às vezes, roubava um relógio ou uma jóia qualquer, passando-a logo para o Bala, como forma de apoio ao grupo. Era um boa-vida, gostava de violão e de ficar fazendo nada, contemplando o mar e os barcos. Seu destino foi virar um verdadeiro malandro, que vivia a correr pelos morros compondo sambas.

Dora: Tinha treze para quatorze anos, era a única mulher do grupo e se adaptou bem a ele. Era uma menina muito simples, dócil, bonita, simpática e meiga. Conquistou facilmente o grupo com seus cabelos lisos. Seus pais haviam morrido de alastrine e ela ficou sozinha no mundo com seu irmão pequeno. Tentou arrumar emprego, mais ninguém queria empregar filha de bexiguento. Aí ela encontrou João Grande e professor que a chamaram para morar no Trapiche, e logo ela já era considerada por todos como uma mãe, irmã e para Bala uma noiva. Ela participava dos roubos com os outros meninos. Morreu queimando de febre.

João-de-Adão: Estivador, negro fortíssimo e antigo grevista, era igualmente temido e amado em toda a estiva. Através dele, Pedro Bala soube de seu pai. Ele tinha conhecido o loiro Raimundo, estivador que tinha morrido, baleado na greve, lutando em prol dos estivadores. Segundo ele, a mãe de Pedro falecera quando ele tinha seis meses; era uma mulher e tanto.

Don'aninha: Mãe de santo, sempre os socorria em caso de doença ou necessidade.

Padre José Pedro: Introduzido no grupo pelo Boa-Vida, conhecia o esconderijo dos capitães.

Querido-de-Deus: Pescador, juntamente com João- de- Adão tinham a confiança dos meninos, que, por sua vez, não mediam esforços para recompensar esse apoio.

Enredo

Tendo como cenário as ruas e as areias das praias de Salvador, Capitães da Areia trata da vida de crianças sem família que viviam em um velho armazém abandonado no cais do porto. Os motivos que as uniram eram os mais variados: ficaram órfãs, foram abandonadas, ou fugiram dos abusos e maus tratos recebidos em casa.

Aproximadamente quarenta meninos de todas as cores, entre nove e dezesseis anos, dormiam nas ruínas do velho trapiche. Tinham como líder Pedro Bala, rapaz de quinze anos, loiro, com uma cicatriz no rosto. Generoso e valente, há dez anos vagabundeava pelas ruas de Salvador, conhecendo cada palmo da cidade.

Durante o dia, maltrapilhos, sujos e esfomeados, mostravam-se para a sociedade, perambulando pelas ruas, fumando pontas de cigarro, mendigando comida ou praticando pequenos furtos para poder comer. Esse contato precoce com a dura realidade da vida adulta fazia com que se tornassem agressivos e desbocados.

Além desses pequenos expedientes, os Capitães da Areia praticavam roubos maiores, o que os tornou conhecidos, temidos e procurados pela polícia, que estava em busca do esconderijo e do chefe dos capitães. Esses meninos se pegos, seriam enviados para o Reformatório de Menores, visto pela sociedade como um estabelecimento modelar para a criança em processo de regeneração, com trabalho, comida ótima e direito a lazer. No entanto, esta não era a opinião dos menores infratores. Sabendo que lá estariam sujeitos a todos os tipos de castigo, preferiam as agruras das ruas e da areia à essa falsa instituição.

Um dia, Salvador foi assolada pela epidemia de varíola. Como os pobres não tinham acesso à vacina, muitos morriam, isolados no lazareto. Almiro, o primeiro capitão a ser infectado, ali morreu. Já Boa-Vida teve outra sorte; saiu de lá, andando. Dora e o irmão, Zequinha, perderam os pais durante a epidemia. Ao saber que eram filhos de bexiguentos, o povo fechava-lhes a porta na cara. Não tendo onde ficar, os dois acabaram no trapiche, levados por João Grande e o Professor.

A confusão, causada pela presença de Dora no armazém, foi contornada por Pedro. Os meninos aceitaram-na no grupo e, depois de algum tempo, vestida como um deles, participava de todas as atividades e roubos do bando. Pedro Bala considerava Dora mais que uma irmã; era sua noiva. Ele que não sabia o que era amor, viu-se apaixonado; o que sentia era diferente dos encontros amorosos com as negrinhas ou prostitutas no areal.

Quando roubavam um palacete de um ricaço na ladeira de São Bento, foram presos. Parte do grupo conseguiu fugir da delegacia, graças à intervenção de Bala que acabou sendo levado para o Reformatório. Ali sofreu muito, mas conseguiu fugir. Em liberdade, preparou-se para libertar Dora. Um mês no Reformatório feminino foi o suficiente para acabar com a alegria e saúde da menina que, ardendo em febre, se encontrava na enfermaria.

Após renderem a irmã, Pedro, Professor e Volta-Seca fugiram, levando Dora consigo. Infelizmente, não resistindo, ela morreu na manhã seguinte. Don'aninha embrulhou-a em uma toalha de renda branca e Querido-de-Deus levou-a em seu saveiro, jogando-a em alto mar. Pedro Bala, inconsolável e muito triste, chorou com todos a ausência de Dora. Alguns anos se passaram e o destino de cada um do grupo foi tomando rumo. Graças ao apoio de um poeta, o Professor foi para o Rio, e já estava expondo seus quadros. Pirulito, que já não roubava mais, entrara para uma ordem religiosa. Sem-Pernas morreu, quando fugia da polícia. Volta-Seca estava fazendo o que sempre tinha sonhado; aliou-se ao bando de seu padrinho, Lampião, tornando-se um terrível matador de polícia. Gato, perfeito gigolô e vigarista, estava em Ilhéus, trapaceando coronéis. Boa-Vida, tocador de violão e armador de bagunças, pouco aparecia no trapiche. João Grande embarcou como marinheiro, num navio de carga do Lloyd.

Após o auxílio na greve dos condutores de bonde, o bando Capitães da Areia de Pedro Bala, tornou-se uma "brigada de choque", intervindo em comício, greves e em lutas de classes. Assim como Pirulito, Bala havia encontrado sua vocação. Passando a chefia do bando para Barandão, seguiu para Aracaju, onde iria organizar outra brigada. Anos depois, Pedro Bala, conhecido organizador de greves e perigoso inimigo da ordem estabelecida, é perseguido pela polícia de cinco estados.

Os Capitães da Areia são heróicos, "Robin Hood"s que tiram dos ricos e guardam para si (os pobres). O Comunismo é mostrado como algo bom. No geral, as preocupações sociais dominam, mas os problemas existenciais dos garotos os transforma em personagens únicos e corajosos.



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